O padre, o sal, os peixes e o Quim


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Hoje estudei o início do Sermão de Sto António aos peixes. Um sermão muito longo, escreva-se de passagem:


Vos estis sal terrae
- «Vós sois o sal da terra»
S. Mateus, 5

"Vós, diz Cristo, Senhor nosso, falando com os pregadores, sois o sal da terra: e chama-lhes sal da terra, porque quer que façam na terra o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção; mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção? Ou é porque o sal não salga, ou porque a terra se não deixa salgar. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores não pregam a verdadeira doutrina; ou porque a terra se não deixa salgar e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina que lhes dão, a não querem receber. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores dizem uma cousa e fazem outra; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes querem antes imitar o que eles fazem, que fazer o que dizem. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores se pregam a si e não a Cristo ; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites. Não é tudo isto verdade? Ainda mal!

Suposto, pois, que ou o sal não salgue ou a terra se não deixe salgar, que se há-de fazer a este sal e que se há-de fazer a esta terra? O que se há-de fazer ao sal que não salga, Cristo o disse logo: Quod si sal evanuerit, in quo salietur? Ad nihilum valet ultra, nisi ut mittatur foras et conculcetur ab hominibus. «Se o sal perder a substância e a virtude, e o pregador faltar à doutrina e ao exemplo, o que se lhe há-de fazer, é lançá-lo fora como inútil para que seja pisado de todos.» Quem se atrevera a dizer tal cousa, se o mesmo Cristo a não pronunciara? Assim como não há quem seja mais digno de reverência e de ser posto sobre a cabeça que o pregador que ensina e faz o que deve, assim é merecedor de todo o desprezo e de ser metido debaixo dos pés, o que com a palavra ou com a vida prega o contrário.

Isto é o que se deve fazer ao sal que não salga. E à terra que se não deixa salgar, que se lhe há-de fazer? Este ponto não resolveu Cristo, Senhor nosso, no Evangelho; mas temos sobre ele a resolução do nosso grande português Santo António , que hoje celebramos, e a mais galharda e gloriosa resolução que nenhum santo tomou. Pregava Santo António em Itália na cidade de Arimino , contra os hereges, que nela eram muitos; e como erros de entendimento são dificultosos de arrancar, não só não fazia fruto o santo, mas chegou o povo a se levantar contra ele e faltou pouco para que lhe não tirassem a vida. Que faria neste caso o ânimo generoso do grande António? Sacudiria o pó dos sapatos, como Cristo aconselha em outro lugar? Mas António com os pés descalços não podia fazer esta protestação; e uns pés a que se não pegou nada da terra não tinham que sacudir. Que faria logo? Retirar-se-ia? Calar-se-ia? Dissimularia? Daria tempo ao tempo? Isso ensinaria porventura a prudência ou a covardia humana; mas o zelo da glória divina, que ardia naquele peito, não se rendeu a semelhantes partidos. Pois que fez? Mudou somente o púlpito e o auditório, mas não desistiu da doutrina. Deixa as praças, vai-se às praias; deixa a terra, vai-se ao mar, e começa a dizer a altas vozes: Já que me não querem ouvir os homens, ouçam-me os peixes. Oh maravilhas do Altíssimo! Oh poderes do que criou o mar e a terra! Começam a ferver as ondas, começam a concorrer os peixes, os grandes, os maiores, os pequenos, e postos todos por sua ordem com as cabeças de fora da água, António pregava e eles ouviam.
Se a Igreja quer que preguemos de Santo António sobre o Evangelho, dê-nos outro. Vos estis sal terrae: É muito bom texto para os outros santos doutores; mas para Santo António vem-lhe muito curto. Os outros santos doutores da Igreja foram sal da terra; Santo António foi sal da terra e foi sal do mar. Este é o assunto que eu tinha para tomar hoje. Mas há muitos dias que tenho metido no pensamento que, nas festas dos santos, é melhor pregar como eles, que pregar deles. Quanto mais que o são da minha doutrina, qualquer que ele seja tem tido nesta terra uma fortuna tão parecida à de Santo António em Arimino, que é força segui-la em tudo. Muitas vezes vos tenho pregado nesta igreja, e noutras, de manhã e de tarde, de dia e de noite, sempre com doutrina muito clara, muito sólida, muito verdadeira, e a que mais necessária e importante é a esta terra para emenda e reforma dos vícios que a corrompem. O fruto que tenho colhido desta doutrina, e se a terra tem tomado o sal, ou se tem tomado dele, vós o sabeis e eu por vós o sinto.

Isto suposto, quero hoje, à imitação de Santo António, voltar-me da terra ao mar, e já que os homens se não aproveitam, pregar aos peixes. O mar está tão perto que bem me ouvirão. Os demais podem deixar o sermão, pois não é para eles. Maria, quer dizer, Domina maris: «Senhora do mar»; e posto que o assunto seja tão desusado, espero que me não falte com a costumada graça. Ave Maria."

Padre António Vieira


Agora compreendemos o porquê da utilização do termo sal. O sal impede a corrupção (purifica). O sal conserva; os pregadores mantêm a palavra de Cristo. Ora, o sal (cloreto de potássio) salga. Se salga e tem efeito de conserva é naturalmente usado para "condimentar" e consevar o bacalhau (vai sair asneira). Relacionemos tudo então: sermão - Padre António Vieira - sal - salgar - Sto António - peixes - bacalhau - Quim Barreiros


Na imagem vemos o nosso amigo Quim segurando um fiel reprodução à escala 1:5 em porcelana do tão conhecido Stº António.

Agora perguntem lá: Ó magnificiente chefe da cozinha, mas afinal de contas (sim, porque tu também sabes fazê-las, magistrais calculações) o que é que o Quiqui tem a ver com o Stº Antoninho?

Olhemos para o refrão de uma célebre faixa deste nosso querido artista (modificado à justa por um devoto discíplo da sua arte, cozinheiro de primeiro grau, mesmo sendo mestre):

"Quero salgar teu bacalhau, maria!
Quero salgar teu bacalhau.
Mariazinha deixa-me ir à cozinha,
deixa me ir à cozinha
'pra eu salgar teu bacalhau"

Resta dizer que nessa época (sév XIII) quem fazia falta era mesmo o Quim Barreiros, esse grande pregador na história da humanidade. Fica o convite para espreitarem uma ou outra mais letra das suas muitas obras.


2 Condimentos “O padre, o sal, os peixes e o Quim”

  1. Blogger Manuel Marques 

    é um pouco estranho estares a comparar o vieira ao quim, mas pronto XD

    ke historia é essa do cloreto d potássio? hummm... espero ke n me ponham isso na comida ;D

  2. Blogger Elsa 

    Hoje comecei no meu blog uma "luta" irónica contra os insultos nos blogs... não só no meu mas nos outros... passas por lá e deixas a tua opinião?
    :-)
    beijo de boa semana!

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